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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 23 de setembro de 2024
 

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Mensagem: Alice Neto, uma grande mulher Hoje quero falar de dona Alice Neto, uma pessoa muito especial e a quem Montes Claros muito deve. Embora não seja montes-clarense por nascimento, ela o era de coração. Filha de grande e tradicional família januarense, cidade bonita, aconchegante e que sabe conquistar o coração de que tem a felicidade de conhecê-la. Dona Alice nasceu nesta cidade ribeirinha e aí passou sua infância, adolescência e parte de sua juventude. De cabelos soltos, pés descalços, livre como um pássaro ela soube aproveitar sua infância, desfrutando ali seus melhores momentos. Aquelas praias, aquele rio emocionavam-na demais, era uma criança sensível e inteligente ao extremo. Quantos castelos construiu naquela areia quente, fumegante que sapecavam seus dedinhos frágeis, mas obstinados... Com outras crianças da sua idade, corria margeando aquele pedaço de rio maravilhoso (dádiva de Deus) que não tinha nenhum segredo para ela. Quantos brinquedos improvisava! Enquanto erguia os enormes castelos de areia, também os pequeninos barcos de papel eram soltos e de olhos velados, os via seguir balançando-se sobre as águas ondulantes que os levaria para longe. Ela corria, pegava-os novamente como a protege-los dos perigos... Irrequieta e inteligente, ela era a própria barranqueira, ágil, rápida tornando-se líder da turminha que brincava nas margens do Velho Chico. Ela andava muito, pesquisava, conhecia de cor e salteado todas as curvas daquele rio, as grutinhas, os esconderijos onde brincavam. Todos os barcos e canoas, com suas enormes carrancas coloridas, de dentes disformes, com suas histórias fantásticas contadas pelos pescadores... O apito melancólico do vapor Benjamim Guimarães (construído em 1913 nos Estados Unidos) chegando de viagem trazendo cargas e passageiros de outras cidades, a despertava. Voltava correndo, deixando para trás os anzóis, as peneirinhas (de pescar piabas) e todas as brincadeiras. Queria ver de perto o vapor enorme, entupidinho de gente e o porão transbordando de cargas. Queria ver os passageiros, forasteiros caras novas, estranhas, vindas de outras cidades. Queria sentir de perto o seu calor, o ruído de suas máquinas, os gritos dos marinheiros, a voz do comandante procurando organizar o desembarque. Aquele corre-corre a fascinaval! Ela era apenas uma criança, e na sua pequenez física, via tudo enorme e encantador. Os anos foram passando e a pequena Alice já era uma adolescente, prenúncio de uma bela mulher. Os brinquedos da praia foram trocados, substituídos. Já não pegava mais peixinhos nas peneiras. Já não soltava barquinhos de papel. Não perambulava pelas praias e margens do rio. Nem construía castelo de areia... Os seus sonhos eram outros, e sensível e romântica, embalando-se nas asas da fantasia os desejos se multiplicavam. Dotada de grande inteligência e uma vontade extremamente decisiva, sentiu que já era hora de deixar aquele bucolismo rural de sua cidade tranqüila. Sentia que precisava crescer intelectualmente, buscar novos horizontes, nova cultura. Diamantina era naquela época a única opção. E com o coração cheio de sonhos e esperança, Alice se foi. Aquele mesmo vapor que na sua infância tanto a fascinava, a conduziu até Pirapora, onde outra condução a levaria até Diamantina, terra da cultura, do diamante, das riquezas e das fantásticas histórias do Brasil Colônia. Alice estava decidida (como sempre) e confiante, embora tivesse o coração transbordando de saudades de sua família, de sua terra e todas as recordações de uma fase feliz de sua vida. Mais tarde, quando voltava, em período de férias, vinha eufórica, cheia de saudades e Januária toda vibrava com a alegria contagiante de Alice. Sempre risonha, bem humorada, ativa, ela sabia organizar festas. Com outras companheiras, transformava a pacata cidade numa folia constante. Muito religiosa, espírito humanitário ao lado da sua companheira de infância e juventude, Julieta (hoje a lídima irmã de Lourdes que todos nós conhecemos e admiramos) as duas juntas faziam um maravilhoso trabalho de catequese, beneficiando a comunidade januarense. Um belo dia chegou seu príncipe encantado. O príncipe que ela sempre esperou. Ela a descobriu entre as demais e a escolheu numa grande festa. E, tomando-a nos seus braços, ao som da música, lançou o seu feitiço. Ele era um perfeito cavalheiro, com uma inteligência brilhante, educação requintada, elegante e bonito e se chamava José Raimundo Neto. Foi um período emocionante para ambos: encontros, alegrias, promessas, juras, passeios nas praias, serenatas em noites enluaradas, enfim, com as artimanhas do cupido, tudo terminou no altar, com véu, grinaldas e flores de laranjeira. Um grande amor os uniu sob aquela célebre sentença: Até que a morte os separe. Professor Raimundo era também inspetor educacional, percorrendo várias cidades na função de educação. Assim sendo, Alice, companheira admirável, o acompanhou sempre, moravam em diversas cidades, entre elas Três Corações, onde nasceu sua filha Heloísa. Montes Claros teve a sorte de receber este casal: Alice e Raimundo Neto e durante muitos anos usufruir da sua companhia. Presentes em todas as reuniões e acontecimentos sociais da nossa cidade, o casal tornou-se muito querido na nossa sociedade. Raimundo Neto, a quem Montes Claros muito deve uma grande parte do seu desenvolvimento cultural e social, foi professor e diretor da nossa Escola Normal durante muitos anos e também presidente da Academia Montesclarense de Letras. Era um grande poeta e excelente orador. Alice Neto, com seu astral maravilhoso, comunicativa ao extremo, amável e educada, conquistou logo o coração do montes-clarense. Era muito querida em nosso meio e recebia, com alegria, em todos os lares, pois, Alice tinha uma maneira especial de tratar as crianças e moços mas também os mais idosos. Irriquieta e alegre, estava sempre planejando alguma coisa, dando tratos à sua inteligência. Ao lado do marido, ela conseguiu ajudar muito nossa terra no seu desenvolvimento cultural e social. Uma das maiores realizações foi o Instituto Dom Bosco, idealizado e criado por ela em 1º de fevereiro de 1935, pioneira em nossa cidade. Numa época em que tudo era difícil em Montes Claros, sem o apoio do governo, ela conseguiu pelo esforço próprio, fundar esta maravilhosa escola que prestou tantos benefícios à nossa terra. Uma escola onde funcionava do curso infantil ao primário, com assistência psicológica e pedagógica com professores especializados. Funcionou nos primeiros anos à rua Dr. Veloso, esquina com a rua Dom João Pimenta, numa casa adaptada. Foi uma luta a sua instalação. Só Deus sabe o que ela sofreu e batalhou, apesar do apoio do professor Raimundo Neto e da comunidade que vibrava de alegria com aquela aquisição. As crianças tinham um jardim de infância que, embora simples na sua fachada, possuía um ambiente adequado e saudável, onde passavam parte do dia recebendo ligações, atividades próprias da sua idade, onde a filosofia era o amor. Quando se passava em frente ao Instituto era comum ouvir as vozes alegres das crianças numa felicidade total, cantando musiquinhas assim: Carneirinho, carneirão. Cabecinha de algodão. Era assim que antigamente Se cantava esta canção: Pequeninos somos nós, Nossa vida é brincar. E depois, sossegadinhos, Para a casa descansar. Alice, ao lado das primeiras professoras do Instituto: Lucíola Babosa, Neusa Dias, Dezuita Ramos, Lygia Dias, Rosita Aquino, Maria Inês Versiane e outras, foram grandes educadoras na nossa Montes Claros antiga. Mais tarde, as próprias filhas de Alice foram também professoras no Jardim de Infância, comungando com a mãe os mesmos ideais. Muitas crianças, meninos e meninas da nossa terra, hoje pais de família, ainda se recordam com muita saudade, do querido instituto, escola tão acolhedora da sua infância. Entre eles: Hélio Brandão, Haroldo Veloso, Waldir Figueiredo, Tarcísio e Haroldo Fraga, doutor Cesário Rocha, Cecílio Barbosa, Cleonice Souto, Nancy Prado, Enza Nobre, Maria Luiza Macedo e muitas outras. Todos têm saudades daquela diretora, que trabalhava por amor, daquela Alice que soube educar crianças, fazendo crescer em seus corações o amor e entusiasmo pela escola e pela vida. A nossa comunidade, hoje ainda, usufrui dos benefícios que prestou, lançando aquela semente que germinou e cresceu, floriu e frutificou durante anos nesta terra. Parabéns, Alice Neto, pelo seu esforço e abnegação em prol da cultura de nossa terra, que você viu coroada de êxito. Parabéns pelos seus oitenta e oito anos de vida útil, vendo que por onde passou semeou apenas o bem, o amor e colheu flores. Que você seja feliz o quanto merece! (N. da Redação: Ruth Tupinambá Graça, de 94 anos, é atualmente a mais importante memorialista de M. Claros. Nasceu aqui, viveu aqui, e conta as histórias da cidade com uma leveza que a distingue de todos, ao mesmo tempo em que é reconhecida pelo rigor e pela qualidade da sua memória. Mantém-se extraordinariamente ativa, viajando por toda parte, cuidando de filhos, netos e bisnetos, sem descuidar dos escritos que invariavelmente contemplam a sua cidade de criança, um burgo de não mais que 3 mil habitantes, no início do século passado. É merecidamente reverenciada por muitos como a Cora Coralina de Montes Claros, pelo alto, limpo e espontâneo lirismo de suas narrativas).

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