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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 23 de setembro de 2024
 

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Mensagem: Velórios - Haroldo Lívio - Antigamente, em minha cidade natal, os sinos da Matriz dobravam, de hora em hora, para anunciar um falecimento. Seguia-se o cerimonial da morte. Duas moças da Pia União das Filhas de Maria, uniformizadas e de fita no pescoço, saíam de porta em porta, convidando para o enterro. O velório era sempre em casa, para que o morto permanecesse mais algumas horas entre parentes e amigos. O velório transcorria, invariavelmente, em meio à grande consternação, entre orações e o mais absoluto respeito pelo irmão que partira. Ninguém ousaria elevar a voz ou mesmo esboçar o mais leve e imperceptível sorriso. Exigia-se, de todos os presentes, decoro e a mais severa compunção. Qualquer comunicação era feita em voz baixa, quase murmurado. As pessoas entravam e saíam do recinto com o maior cuidado possível, discretamente, como se temessem despertar o finado do sono eterno. A apresentação de pêsames à família enlutada era executada segundo as regras de etiqueta então em vigor. Havia lances surpreendentes, como no velório de meu irmão de três meses de nascido, quando um senhor idoso, muito polido e cerimonioso, deu parabéns a Mamãe por haver mandado mais um anjo para o céu. Abalada pela dor da perda inconsolável, ela nem pôde notar a delicadeza e o lirismo do cumprimento. Normalmente, o cortejo fúnebre passava pela igreja, onde o pároco celebrava o ritual da encomendação.Quando o falecido era pessoa de alto relevo, como meu padrinho Egídio, celebrava-se a missa de corpo presente e havia a participação da banda de música local, que acompanhava o cortejo arrancando lágrimas de saudade até dos corações mais empedernidos. Conforme a biografia do falecido, acontecia o pungente discurso à beira da sepultura, encerrando o cerimonial da morte. Todos voltavam para suas casas, calados, com cara de enterro, e o morto ficava sozinho em seu jazigo perpétuo, cercado de coroas de flores. Na Montes Claros de hoje, em crescimento galopante e com a sociedade vivendo um período de transição para metrópole, vai desaparecendo o cerimonial da morte, principalmente quando o falecido é pessoa pública e de largo círculo de relações sociais. Nota-se que as pessoas que chegam ao local do velório encontram parentes, amigos ou conhecidos que não viam há muito tempo e se esquecem de que devem observar silêncio e, sobretudo, respeitar a solenidade do funeral. As pessoas, distraidamente e sem nenhuma intenção de irreverência diante do ente querido que partiu para a eternidade, confraternizam-se em clima de alegria, falando alto e se esquecendo de que se encontram em um recinto sagrado. Essas pessoas, infelizmente, somos todos nós, que não resistimos à tentação do bate-papo com o amigo que anda sumido ou veio de longe para o enterro. Tomemos o exemplo do velório da pranteada e querida Amelinha Prates Souto, pessoa das mais estimadas e admiradas da sociedade montes-clarense. Quem ali chegasse sem ver o grande número de coroas mortuárias que ornamentavam o local e davam uma idéia do prestígio pessoal da homenageada, imaginaria, pelo vozerio reinante no ambiente, que havia chegado em uma comemoração festiva. Houve mesmo um momento em que a oração dos presentes no salão foi interrompida por apoteótica salva de palmas. Em Montes Claros é assim e não tem jeito de mudar...Teria havido um ambiente fúnebre, se não estivesse recebendo sua derradeira homenagem pública uma pessoa que encarnava as virtudes e qualificações do que esta cidade tem de mais autêntico e tradicional. Amelinha era jucapratista de quatro costados e incorrigível em seu bairrismo. Nasceu na praça que tem o nome de um seu tio-avô, o Doutor Chaves. Seu avô materno é o patrono da Rua Camilo Prates. Seu primo João Chaves dá nome a avenida. Seu sogro é o homenageado da Rua João Souto, onde morava há alguns anos, e seu esposo, nosso primeiro ortopedista, é lembrado pela Rua Dr. José Veloso Souto, na Morada do Sol. Com tantas homenagens e pelo tanto que trabalhou para o engrandecimento de sua terra, ninguém conseguiria controlar as emoções de todos que foram apresentar suas despedidas à pequenina grande filha de Montes Claros. Estamos todos perdoados pela falta de educação.

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